A arte de construir novos conceitos inspirando-se em velhas ideias

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Em razão da rotina que levo, tenho a oportunidade de estar em contato diário com pessoas que me indicam “qualquer coisa” genial. Criações próprias ou de terceiros que merecem a atenção devida.

Na maioria das vezes, trata-se de ideias simples, quase “óbvias”, capazes, porém, de resolver problemas aparentemente complexos. O tipo de solução que nos leva ao questionamento inato, característico de situações como essa: “como não pensei nisso antes”?

Inquieto para saber a resposta da interrogativa acima, decidi realizar uma investigação pessoal, expandindo tal pesquisa ao nível das artes, da ciência e de acontecimentos relevantes que, de alguma forma, influenciaram a história da humanidade. Queria descobrir a matriz das ideias dos grandes personagens de todos os tempos, dedicando o meu tempo à tentativa de análise dessa origem.

Tal foi minha surpresa ao perceber que, de forma independente ao tempo que tais figuras viveram, a fonte de inspiração para os seus feitos geniais era sempre a mesma: o passado.

Parece loucura, mas todo o material que utilizei para fazer esse levantamento (livros, filmes, músicas, artigos científicos), de algum modo, foi inspirado em exemplares muito parecidos produzidos anteriormente.

A combinação de informações acima pode suscitar a seguinte indagação: então, todos os grandes gênios são meros reprodutores e, de certo modo, não mereciam o reconhecimento obtido?

Na minha opinião, não.

Observemos, como exemplo, a própria maneira de perpetuação da espécie humana, a chamada reprodução sexuada. Ao contrário da maneira vegetativa, células de dois indivíduos diferentes devem se combinar para gerar um novo ser. Esse tipo de reprodução é o mais importante sob o ponto de vista evolutivo, pois reúne, em um mesmo descendente (filho), fatores originários de dois indivíduos (pai e mãe). Se para a evolução do mundo a combinação genética de duas partes diferentes se faz necessária, no mundo das ideias, outro tipo de união se faz essencial. Nada surge “do nada”.

Criação requer influência. No intuito da realização do novo, baseamo-nos no que vimos, bem como nas nossas experiências. Tais referências responsabilizam-se pelas adaptações que, muitas vezes, resultam em ideias novas.

Steve Jobs, o grande gênio inventivo de nossa época, é um bom exemplo dessa corrente de pensamento. No passado, o futuro mestre da Apple tinha aulas de caligrafia no Reed College. E ele próprio afirmou: “Aprendi sobre como se faz uma boa tipografia. Dez anos mais tarde, quando criávamos o primeiro computador da Macintosh, colocamos tudo isso no Mac. É claro que era impossível conectar todos esses fatos olhando para frente naquela época. Você só consegue fazer isso quando olha para trás”.

Para enriquecer tal argumentação, tiro o foco do pensamento de uma única personalidade e o recoloco em um país inteiro. Embora a China tenha ganhado a fama (merecida) no passado de falsificar grandes marcas, entregando cópias baratas e sem qualidade de seus produtos, a realidade atual é bem diferente. Entre outros feitos, o grande país do continente asiático já é responsável pela construção do trem mais rápido do mundo, do computador mais veloz e mais avançado já fabricado e, quem diria, por uma das grifes de roupas mais desejadas (e caras) de todo o globo. O segredo para tais realizações? Eles esperam.

Eu explico.

A criação original tem o chamado custo de inovação. Em outras palavras, custa muito caro ser o primeiro. Deve-se investir milhões em pesquisas, desenvolvimento, protótipos e produção para se chegar a um produto inédito. Além dessa dificuldade, surge a realidade da cópia. O produto original , não raro, “sofre” para competir com o preço de um “similar”. Muitas vezes ser o primeiro não é bom. O segundo vai te copiar, melhorar o seu produto e, graças à tecnologia, fará isso por um preço bem inferior ao seu. Lembra da China?

Voltando à reflexão inicial, apesar da linha tênue que separa a estrutura dessas duas maneiras de se produzir ideias, enxergo uma diferenciação clara entre a cópia como instrumento de replicação e a combinação de modelos existentes sendo adaptados e melhorados no intuito de se chegar a um resultado inédito.

Com o fim das barreiras comunicacionais é inútil ignorar o que já foi feito. Ficará atrasado aquele que não se aproveitar da quantidade de “aprendizado” que pode ser obtida na pesquisa oferecida pela mera observação de ideias prontas.

No entanto, deve-se ter na consciência que copiar um produto, serviço ou uma ideia, sem fazer qualquer alteração estrutural, com o escopo de enriquecimento, é, na linguagem popular, piratear (ou seja, crime); basear-se, porém, no pré-existente, com o intuito de aprender, analisar, copiar e transformar é dar um passo em direção à evolução.

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Rodrigo Rocha é diretor de marketing da Amil, onde atua também na parte de Inovação. É cofundador da One Health, unidade de negócio do grupo Amil voltada ao segmento premium. Foi um dos primeiros executivos do Brasil a se integrar à Singularity University, no Vale do Silício, considerada a universidade que cria o futuro. Obteve o MBA em Finanças pelo IBMEC.

Fonte: HSM

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